Biografia de Eliphas Levi Zahed
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Texto do acervo da
Sociedade de Ciências Antigas
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Eliphas Levi Zahed é tradução hebraica de Alphonse Louis Constant,
abade francês, nascido no dia 8 de fevereiro de 1810 em Paris. O maior
ocultista do século XIX, como muitos o consideram, era filho de um
modesto sapateiro, Jean Joseph Constant e de Jeanne-Agnès Beaupurt, de
afazeres domésticos. Possuía uma irmã, Paulina-Louise, quatro anos mais
velha do que ele. Apesar de mostrar desde menino aptidão para o
desenho, seus pais encaminharam-no para o ensinamento religioso. |
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Eliphas Levi, em 1836
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Foi assim que aos dez anos de idade ingressou na
comunidade do presbitério da Igreja de Saint-Louis em Lille, onde
aprendeu o catecismo sob a direção do abade Hubault, que selecionava os
garotos mais inteligentes e que demonstravam alguma inclinação para a
carreira eclesiástica. Desse modo, Eliphas foi encaminhado por ele ao
seminário de Saint-Nicolas du Chardonnet, para concluir seus estudos
preparatórios. A vida familiar cessou para ele a partir desse momento.
No seminário, teve a oportunidade de aprofundar-se nos estudos
lingüisticos e aos dezoito anos já era capaz de ler a bíblia em seu
texto original.
Em 1830, foi transferido para o seminário de Issy para cursar
Filosofia. Dois anos mais tarde, ingressou em Saint-Sulpice para estudar
Teologia. Foi em Issy que escreveu seu primeiro drama bíblico,
intitulado Nemrod; no grande seminário de Saint-Sulpice criou seus primeiros poemas religiosos, dotados de uma grande beleza. |
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Após seu curso de Teologia, Eliphas ingressou nas ordens
maiores, sendo ordenado sub-diácono e encarregado de ministrar o
catecismo para meninas. "Esse ministério, diz Eliphas, tão poético e
tão suave, foi para mim muito agradável; parecia-me que eu era um anjo
de Deus, enviado a essas crianças para iniciá-las na sabedoria e na
virtude; as palavras tornavam-se abundantes para elas em meus lábios,
pois meu coração estava repleto e tinha necessidade de expandir-se".
Nosso jovem Alphonse são tardou a sentir o despertar em seu
interior da força de sua juventude asceticamente reprimida desde a
adolescência. Um dia, quando estava ensinando o catecismo às meninas,
alguém chamou-o à sacristia. Era uma senhora, com uma jovem pálida e
tímida, que pediu a Eliphas que a preparasse para a primeira comunhão.
Outros padres tinham recusado por ser ela pobre e a filha doente e
tímida. Eliphas não só aceitou a tarefa, como prometeu tratá-la como
filha. A menina, que se chamava Adele Allenbach, de uma beleza pura e
cândida, pareceu a Eliphas ser a imagem da própria Virgem Maria. Essa
beleza juvenil correspondeu para ele a uma "iniciação a vida", pois
amou-a ternamente como se fosse uma deusa. |
Eliphas Levi foi ordenado diácono
em 19 de dezembro de 1835; em maio de 1836 teria sido ordenado
sacerdote se não tivesse confessado a seu superior o amor que devotava à
jovem. Suas convicções religiosas receberam um choque tão grande, que
Eliphas sentiu-se jogado fora da carreira eclesiástica.
Após 15 anos de estudos, Eliphas deixou o grande seminário para
ingressar no mundo, tinha então vinte e seis anos de idade. Sua mãe, ao
saber disso, suicidou-se. Abalado, sem experiência do mundo, teve
muitas dificuldades para encontrar um emprego. Essa dificuldade
aumentava ainda mais pelo boato que correu, segundo o qual teria sido
expulso do seminário. Após ter percorrido o interior da
França, trabalhando em um circo, Eliphas encontrou em Paris alguns
trabalhos como pintor e jornalista. Fundou, com seu amigo Henri-Alphonse Esquirros, uma revista denominada "As Belas Mulheres de Paris", na qual aplicava-se como desenhista e pintor e Esquirros como redator.
Mas, apesar desse pequeno parêntese em sua vida, Eliphas não tinha perdido sua inclinação para a vida religiosa. |
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Eliphas Levi, em 1848. |
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Despediu-se de Esquirros e partiu, em 1839, para o convento de Solesmes, dirigido por um abade rebelde.
Eliphas aí encontrou uma biblioteca com mais de 20.000
volumes, iniciando-se na leitura dos antigos Padres da Igreja, dos
Gnósticos e de alguns livros ocultistas, principalmente os da Senhora
Guyon: "A vida e os escritos dessa mulher sublime, diz-nos Eliphas,
abriram-me as portas de inúmeros mistérios que ainda não tinha podido
penetrar; a doutrina do puro amor e da obediência passiva de Deus
distanciaram-me inteiramente da idéia do inferno e do livre arbítrio;
vi Deus como o ser único, no qual deveria absorver-se toda
personalidade humana. Vi desvanecer o fantasma do mal e bradei: um crime
não pode ser punido eternamente; o mal seria Deus se fosse infinito!".
Eliphas vislumbrou, através do Spiridion
e de outros escritos dessa autora, o reino futuro do Espírito Santo, o
trabalho do homem de amanhã. O Cântico dos Cânticos lhe foi revelado;
compreendeu por que em teologia a esposa tinha preferência em relação a
mãe. Ficou imensamente feliz ao compreender que todos os homens
poderiam ser salvos. Partiu de Solesmes sem dinheiro, sem roupas, mas
com uma profunda paz no coração. Não acreditava mais no inferno! |
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Serpente Solar "Dogma e Ritual da Alta Magia" |
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Eliphas Levi passou, então, de emprego em emprego,
sempre perseguido pelo clero que via nele um apóstata. Foi então que
escreveu sua Bíblia da liberdade, desejando dividir com seus irmãos as
alegrias de suas descobertas (1841). Essa publicação custou-lhe oito meses de prisão
e 300 francos de multa! Foi acusado de profanar o santuário da
religião, de atentar contra as bases da sociedade, de propagar o ódio e
a insubordinação.
Foi mais ou menos por essa época que conheceu os escritos de Swedenborg. Segundo Eliphas, tais escritos não contêm toda a verdade, mas conduzem o neófito com segurança na senda.
Ao sair da prisão, realizava pequenos trabalhos, principalmente
pintura de quadros e murais de igrejas e colaborações jornalísticas.
Apesar dos contratempos materiais, não deixou jamais de aperfeiçoar
seus conhecimentos e enriquecer sua erudição. |
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Foi após Swedenborg que encontrou os grandes magos da Idade Média, que lhe deram a grande direção: Guillaume Postel, Raymond Lulle, Henry Corneille Agrippa. Assim em 1845, aos trinta e cinco anos de idade, escreveu sua primeira obra ocultista, intitulada O livro das Lágrimas ou O Cristo Consolador.
Em 13 de julho de 1846 casou-se com Marie Noémi Cadiot,
matrimônio que durou sete anos. Esse casamento foi para ele um
suplício. Instigado pela mulher, lançou-se a escrever panfletos
políticos, resultando-lhe um segundo período de cárcere. Em 3 de
fevereiro de 1847, foi condenado a um ano de prisão
e ao pagamento de mil francos de multa, acusado de levar o povo ao
ódio e ao desprezo do governo imperial. Sua mulher, grávida, percorreu
os ministérios a fim de obter a redução da pena imposta a seu marido, o
que conseguiu após seis meses.
Em 1847, sua esposa deu à luz uma menina, que faleceu em 1854, para desespero de seu pai, que a adorava. Era uma criança muito doente e esteve várias vezes à morte. "Um dia, conta Eliphas Levi, trouxeram-me
essa pobre criança agonizante, porque não ouso dizer morta, por uma
estúpida mulher que Noemi, incapaz de ser mãe, tinha admitido como
ama-de-leite. |
"A criança estava fria; o coração e o
pulso não batiam mais. Noemi, que não soube cuidar dela como devia,
estava furiosa, dizendo que mataria o filho da ama-de-leite (que mulher
eu tinha, grande Deus!). Para apaziguá-la, jurei-lhe que a menina não
estava morta. Transportei o pobre corpo para a cama e coloquei-o sobre
meu peito; assoprei ao mesmo tempo em sua boca e em suas narinas; senti
que ela começava a se destorcer. Peguei em seguida um pouco de água
morna e bradei: Maria! Si quid est in baptismate catholico
regenerationis et vitae, vive christiana! Ego enim te baptizo en nomine
Patris et Filii et Spiritus Sancti. Meu amigo, não vos conto um
sonho: a criança abriu imediatamente seus grandes olhos azuis
espantados e sorriu... Levantei-me precipitadamente com um grande grito
de alegria e conduzi-a aos braços de sua mãe, que não podia acreditar
no que estava vendo".
A Vontade, a Fé, o poder do Verbo Humano, juntos, operam as maravilhas da Natureza que os profanos denominam milagre...
Em 1848, Eliphas Levi fundou um clube político, denominado Clube da Montanha, com fins eleitorais, no qual era presidente; Noemi Constant era a Secretária e Esquirros um dos vice-presidentes. |
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Os Sete Selos
"Dogma e Ritual da Alta Magia" |
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Para sorte dos ocultistas, somente Esquirros
foi eleito Deputado para a Assembléia Nacional (1849). Em 1851,
Esquirros partiu para o exílio, na Inglaterra, onde escreveu uma série
de obras, sendo uma delas de cunho ocultista, apesar de seu título (O Evangelho do Povo). Entre os discípulos de Esquirros contava-se Henri Delaage, Iniciador de Papus, em 1882 na Sociedade dos Filósofos Desconhecidos, entidade que provém de Louis Claude de Saint-Martin.
Foi a partir desse episódio que Eliphas Levi abandonou integralmente
sua obra social, para dedicar-se exclusivamente ao Ocultismo.
"Na Bíblia da Liberdade, explica-nos Eliphas, saudamos
o gênio da revolução, do progresso e do futuro. Na festa de Deus,
Assunção da Mulher e Emancipação da Mulher procuramos explicar nossa
religião materna. Na Última Encarnação demonstramos o papel do Cristo
sobre a terra e saudamos o gênio do Evangelho, marchando à frente do
progresso. Agora, nossa obra social está concluída; não pedimos por
ela, indulgência nem severidade. Escrevemos o que ditou nossa
inteligência e nosso coração". |
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Símbolo da Excomunhão
"Dogma e Ritual..."
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Sabemos a origem dos estudos ocultistas de Eliphas Levi,
mas permanece obscura sua origem iniciática. Sabemos de suas relações
de amizade com Hoene Wronski e com Edward Bulwer Lytton.
O polonês Wronski, falecido no dia 9 de Agosto de 1853, em Paris,
deixou setenta manuscritos catalogados por sua esposa, à Eliphas Levi e
outros, os quais foram doados à Biblioteca Nacional de Paris.
Em 1854, um ano após a morte de Wronski, Eliphas viajou à Londres,
onde se encontrou com inúmeros ocultistas ingleses, que lhe pediram
revelações e prodígios. Longe de querer iniciá-los na magia cerimonial,
isolou-se no estudo da Alta Cabala.
Havia, contudo, um Adepto de primeira linha, que se tornou grande amigo de Eliphas Levi: Bulwer Lytton, autor de Zanoni, Os Últimos Dias de Pompéia, A Raça Futura,
etc. Os dois Mestres teriam trocado informações iniciáticas dos mais
altos interesses para as sociedades ocultistas, das quais certamente
eram os chefes.
Acredita-se, inclusive, que tenham realizado trabalhos espirituais entre 20 e 26 de julho de 1854, em Londres.
As anotações relacionadas com esses eventos foram parar nas mãos de
Papus, sendo publicadas, em parte, em um dos números da Revista L´Initiation. |
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Registram três visões, de São João, de Jesus e de Apolônio
de Tiana, os quais lhes teriam revelado os mistérios dos Sete Selos do
Apocalipse; alguns enigmas do futuro, que desejavam saber; detalhes da
Magia Celeste (revelados pelo livro do Rabino Inaz
que lhes indicaram onde encontrar), as chaves dos milagres, bem como o
sagrado dever de honrar a Coroa, uma vez conquistada. Retornando a
Paris, instalou-se no atelier do pintor e discípulo Desbarrolles,
uma vez que estava separado de sua esposa Noemi (fato ocorrido antes
de partir para Londres). Desenrolou-se nova etapa em sua vida. Foi a
fase do Adepto.
Em 1855 fundou a Revista Filosófica e Religiosa (cujos artigos principais encontram-se em seu livro A Chave dos Grandes Mistérios). |
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A visão de Esequiel
"Dogma e Ritual da Alta Magia"
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Nesse mesmo ano publicou seu Dogma e Ritual da Alta Magia e o poema Calígula, identificado no personagem, o imperador Napoleão III. Foi preso imediatamente. Na prisão escreveu uma réplica, o Anti-Calígula, retratando-se. Foi posto em liberdade.
Em 1859 veio à luz sua História da Magia, formando com A Chave e o Dogma a Trilogia ocultista tida como bíblia por seus discípulos, entre os quais, nessa época, figuravam Desbarrolles, Delaage e Rozier.
Os dois últimos vieram a transmitir a Papus e aos demais ocultistas do
fim do século XIX o precioso depósito da Tradição, proveniente de Martinez de Pasqually, Willermoz, Saint-Martin e vivificada por Eliphas Levi.
O círculo de amigos de Eliphas Levi era constituído por uma elite de homens de Desejo, que se reuniam na casa de Charles Fauvety. Constavam entre os discípulos parisienses, além dos mencionados acima, Louis Lucas (autor de Química Nova), Louis Ménard (tradutor de Hermes Trismegistro), o conde Alexandre Branicki, Littré, Considérant, Reclus, Leroux, Caubet, Eugène Nus, Constantin de Branicki.
O Conde Alexandre de Branicki, polonês, amigo pessoal de
Bulwer Lytton, era tido como o principal discípulo de Eliphas Levi, "o mais avançado em Cabala". |
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Mas nem todos os discípulos do Mestre habitavam em Paris, como era o caso do Barão Nicolas-Joseph Spedalieri, nascido em 1812, na Sicília. Iniciado desde os vinte anos na Sociedade dos Martinistas de Nápoles,
era leitor assíduo de Louis Claude de Saint-Martin, o Filósofo
Desconhecido. Aos trinta anos, fixou residência na França (Marselha).
Em 1861, entrou em contato com o autor do Dogma e Ritual de Alta Magia,
tornando-se seu discípulo. A correspondência entre Eliphas e
Spedalieri, iniciada em 24 de Outubro de 1861, prolongou-se até 14 de
Fevereiro de 1874.
Apesar de cultivar relações de amizade com pessoas ricas, que
freqüentava, Eliphas levava uma vida bastante simples. Suas regras eram:
"uma grande calma de espírito, um asseio com o
corpo, uma temperatura sempre igual, de preferência um pouco mais fria
do que quente, uma habitação arejada e bem seca, onde nada lembre as
necessidades grosseiras da vida, refeições regulares e proporcionais ao
apetite, que deverá ficar satisfeito e não excitado. Uma alimentação
simples e substanciosa; deixar o trabalho antes do cansaço; fazer um
exercício moderado e regulado; jamais aquecer-se ou excitar-se à noite,
para que a maior calma preceda o sono. Com uma vida regulada assim,
pode-se prevenir todas as doenças, que se apresentam sempre sob a forma
de indisposições, fáceis de combater com remédios simples e brandos...
uma xícara de vinho quente para o enfraquecimento e o resfriado, alguns
copos de hidromel! como purgativo, infusão de borragem (planta de largas flores azuis, que crescem em regiões temperadas; suas infusões são sudoríferas, diuréticas e depurativas) e leite para a gripe, muita paciência e alegria farão o resto". |
Em agosto de 1862 editou seu livro Fábulas e Símbolos,
considerado por ele mesmo como o mais profundo que escreveu. Ao
elaborar essa obra, conta-nos Eliphas, o Espírito projetou-se em sua
alma, de sorte que via todo o conteúdo do livro na Luz, antes de ser
escrito. Toda a obra foi feita de um só fôlego, sem qualquer rasura. As
idéias brotavam espontaneamente e coisas simples e belas emergiam da
Luz, admirando o próprio autor. "Que a Vontade de Deus seja feita! – conta Eliphas Levi em suas correspondências –
Estou maravilhado e espantado pelas grandes obras que Ele me faz
executar. Se soubésseis como meu mérito é pequeno... Sou um verdadeiro
cadáver que o Espírito Santo anima".
Suas obras causavam impacto no mundo ocultista da França e do
exterior. Recebia visitas de toda espécie: curiosos, ocultistas,
estudantes sinceros, aprendizes de feiticeiro ... "Um dia, conta ele,
entre três e quatro horas da tarde, ouvi alguém bater a minha porta.
Eram sete batidas secas, assim espaçadas: 00-0-00-00. Abri a porta e um
rapaz muito bem vestido e de boa apresentação entrou lentamente,
rindo, com um ar um pouco sarcástico, dizendo-me em um tom familiar:
"meu caro Senhor Constant, estou encantado por encontrá-lo em casa". |
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Instrumentos mágicos
"Dogma e Ritual da Alta Magia" |
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Tendo dito isso, passou para meu
escritório como se estivesse em sua própria casa e sentou-se em minha
poltrona. "Mas Senhor, disse-lhe, não vos conheço"! Ele soltou uma
gargalhada: "Sei perfeitamente disso: é a primeira vez que me vedes,
pelo menos sob esta forma. Mas eu vos conheço muito bem! Conheço toda
vossa vida passada, presente e futura. Ela está regulada pela lei
inexorável dos números. Sois o homem do Pentagrama e os anos terminados
pelo número cinco sempre vos foram fatais. Olhai para traz e julgai:
em 1815 vossa vida moral começou, pois vossas recordações não vão além,
em 1825 ingressastes no seminário e entrastes na liberdade de
consciência; em 1845 publicastes A Mãe de Deus, vosso primeiro
ensaio de síntese religiosa, e rompestes com o clero; em 1855 vós vos
tornastes livre, abandonado que fostes por uma mulher que vos absorvia e
vos submetia ao binário. Notais que se houvésseis continuado juntos,
ela vos teria anulado completamente ou teríeis perdido a razão. |
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Baphomet
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"Partistes em seguida para a
Inglaterra; ora, o que é a Inglaterra? Ela é o Iod da Europa atual;
fostes temperar-vos no princípio viril e ativo. Lá vistes Apolônio,
triste, barbeado e atormentado como estáveis naquele período. Mas esse
Apolônio, que vistes era vós mesmo; ele saiu de vós, entrou em vós e em
vós permanece".
"Vós o revereis neste ano de 1865, mais bonito, radioso e
triunfante. O fim natural de vossa vida está marcado (salvo acidente)
para o ano de 1875; mas se não morrerdes neste ano, vivereis até 1885.
Apolônio, quando o vistes, temia as pontas das espadas; vós as temeis
como ele, pois neste momento, me tomais por um louco. Como um dia
alguém quis assassinar-vos [Em 1862, com
efeito, um alucinado procurou Eliphas Levi durante dezoito meses, para
assassina-lo. Um dia ele apareceu com um punhal em uma mão e um
exemplar do Dogma e Ritual da Alta Magia em outra. O mestre encarou-o
com brandura. Falou-lhe com docilidade e ele foi embora tremendo], perguntais inquietamente se não vou terminar minha extravagante alocução com um gesto semelhante (aqui começou a rir).
"Sim, sou louco, acrescentou, retomando seu ar sério, mas não sou a
loucura morta, sou a loucura viva; ora, a loucura viva é o inverso da
sabedoria de Deus. Sabeis vós o que é Deus? Deus sois vós, pois Satã é
Deus visto ao contrário. |
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"Existem atualmente dois grandes
escritores, continuou o estranho visitante, que são úteis à Ciência,
Mirville e Eliphas Levi. A todo tempo são necessárias duas colunas; vós
sois Jakin, ele é Boaz. Sabeis bem que nenhuma força se produz sem
resistência, nenhuma luz sem sombra, nenhuma afirmação sem negação".
Calou-se por alguns instantes e eu lhe perguntei:
– Sois Espírita? Respondeu-me gravemente:
"Os espíritas são escorpiões que inoculam um veneno cadavérico sob
as pedras tumulares. Atraem os mortos, mas não os ressuscitam. Em breve
a terra estará coberta de cadáveres que andam. Estamos em uma época de
morte. Louis-Philippe era um Mercúrio sem asas na fronte; ele as tinha
nos pés e foi-se. Napoleão III é um Júpiter sem estrela; após ele virá
o Saturno coxo e o rei dos padres. O Senhor Conde de Chambord... "O
visitante refletiu um instante, olhou-me fixamente e disse de repente:
"Por que não quereis ser papa"? |
"Dessa vez fui eu quem soltou uma gargalhada. Respondi-lhe:
– Porque não quero ser despropositado.
"Ah! disse-me ele, ainda tendes um véu para rasgar e não conheceis
vossa força toda-poderosa, acrescentou, retratando-se. Nós dois já
criamos e destruímos muitos mundos e vós não ousais aspirar a governar
um. Esperai, então, a derrota, o esmagamento dos tímidos, a cruz desse
pobre homem que se chamava Jesus Cristo".
"Mas, finalmente, quem sois vós?", perguntei-lhe, então, levantando-me.
"Vós negastes minha existência, respondeu-me ele; chamo-me Deus. Os
imbecis denominam-me Satã. Para o vulgo chamo-me Juliano Capella. Meu
envelope humano tem vinte e um anos; ele nasceu em Bordéus; tem pais
italianos".
"Enquanto esse rapaz falava, eu sentia um peso extraordinário na
cabeça; parecia-me que minha testa iria explodir. Observava meu
interlocutor com surpresa. Seu rosto lembrava os retratos de Lord Byron,
com menos correções nos traços; possuía as mãos muito brancas e
carregadas de anéis, o olhar seguro e crepitante de sarcasmos, a boca
vermelha, os dentes regulares".
O curioso visitante partiu e jamais os biógrafos de Eliphas Levi encontraram qualquer traço dele. |
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Roda da Fortuna
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O ano de 1865, como ele tinha predito, foi triunfal para Eliphas, pois a publicação de sua Ciência dos Espíritos trouxe-lhe enorme reputação entre os ocultistas de seu tempo.
No dia 31 de maio de 1875 faleceu Eliphas Levi.
Aqueles que o acompanharam até o último momento testemunharam sua
grande coragem e resignação. No momento de expirar, estava bastante
calmo. Sua vida tinha sido plena de realizações espirituais.
Havia cumprido a missão de iniciado e de iniciador. Acima de seu
leito, estava fixado um crucifixo, que olhava seguidamente nos últimos
momentos.
Disse antes de expirar: "Ele prometeu o Consolador, o Espírito. Agora espero o Espírito, o Espírito Santo". O Mestre faleceu logo em seguida.
Dedicando praticamente todo seu tempo à pesquisa da verdade e ao
apostolado perante seus discípulos, Eliphas Levi levou uma vida bastante
humilde. Os bens materiais que possuía não passavam de muitos livros e
algumas obras de arte, como prova seu testamento, redigido em uma quarta-feira, no dia 26 de maio de 1875, cinco dias antes de sua morte:
"Em nome da Justiça e da Verdade, este é meu testamento: |
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Eliphas Levi, em 1864
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[http://www.la-rose-bleue.org/albums.html]
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"Lego ao Conde Georges de Mniszech meus manuscritos, livros e instrumentos de ciência, particularmente uma dupla esfera metálica, resumo de todas as ciências. [Trata-se do famoso "Prognóstico de Wronski", aparelho reencontrado por Eliphas Levi em um antiquário de Paris].
"Desejo que ninguém toque em meus; manuscritos, a não ser o Conde
de Mniszech, a condessa sua esposa, o Conde Branicki e a senhora Gustaf Gebhard, que reside na rua Koenigstrasse, 64, em Esberfeld.
"Meu amigo Edouard Pascal, que se ocupou de mim com
o maior devotamento, escolherá dentre meus livros não científicos e
entre meus objetos de arte e de curiosidade o que lhe interessar.
"Lego à minha irmã Pauline Bousselet, que sou forçado a deserdar, por causa de meu cunhado, todos os meus quadros e objetos de devoção.
"Desejo, ademais, que todas minhas vestes e roupas em geral sejam legadas às irmãs de caridade da rua Saint-Jacques.
"O que resta de móveis, curiosidades, tapeçarias, vasos, pratos de
cobre, etc., será vendido e o resultado dividido entre as pessoas que
se ocuparem de mim até os últimos momentos; não me refiro a mercenários,
mas a amigos". |
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O Conde de Mniszech faleceu em 1885. Os manuscritos de Eliphas Levi foram vendidos e dispersos; mas graças a Stanislas de Guaita foram reencontrados. Cabe salientar que a Condessa de Mniszech era prima da Condessa Keller, esposa de Saint-Yves d´Alveydre, o Mestre intelectual de Papus, fato que certamente facilitou a recuperação dos preciosos manuscritos.
Edouard Pascal ficou
também com a espada mágica de Eliphas Levi e com a famosa caderneta de
anotações referentes aos trabalhos mágicos de Londres. Em 1894 esses
objetos caíram nas mãos de Papus, graças a intercessão de amigos que
conheciam a viúva de Pascal. |
O Alphonse Chenevier, filho de Eliphas Levi
que só viu o pai no dia de sua morte, acompanhou-o até a sua última
morada. Alphonse era filho de Eliphas Levi e de Eugénie Chenevier. Em
1867, Eliphas quis ocupar-se de seu filho, mas não se entendeu com
Eugene. Até sua morte não mais avistou Eugene e o filho. Este,
informado por um amigo, conseguiu rever o pai sobre seu leito de morte.
Alphonse Chenevier foi visitado, em 1914, por Chacornac, que ficou
admirado com sua extrema semelhança com Eliphas Levi. Era um velho de
estatura média, de cabelos brancos e que exalava bondade. Mostrou-lhe
sua biblioteca, com quase todas as obras de seu pai, cuidadosamente
encadernadas.
Alphonse presenteou Chacornac com um busto de Eliphas e com um de seus manuscritos, denominado O livro de Hermes.
Compunha-se de 294 folhas, com 47 figuras no texto e com 78 lâminas do
Tarot, em anexo, desenhadas pelo próprio autor. Em 1919, Chacornac
encontrou-se com o neto de Eliphas Levi, filho de Alphonse Chenevier. |
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Eliphas Levi, em 1874 |
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[http://www.la-rose-bleue.org/albums.html]
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Ele legou ainda, em 1914, a amigos de Papus, manuscritos inéditos de Eliphas e objetos pessoais do Mestre.
A Tradição Ocultista continuou através dos discípulos
póstumos de Eliphas Levi Zahed. A vida continua depois da vida; o sol
parte e vem a noite; mas ele não deixa de renascer no dia seguinte,
para aquecer e iluminar todos os recantos da Natureza. |
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Notas |
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Textos de referência para esta biografia:
– P. Charconac, Eliphas Levi, Rénovateur de l´Occultisme em France. Paris, Charconac Freres, 1926, p.17.
– A. L. Constant, Livre des Larmes ou le Christ Consolateur. Paris, Paulier, 1845, p.214.
– A. L. Constant, L´Assomption de la Femme ou le livre de L´Amour. Paris, Le Gallois, 1841, p. XIX.
– A. L. Constant, Le Testament de la Liberté. Paris, Frey,1848, p. 218-9.
– Eliphas Levi, Correspondência, tomos de I a IX. (Sua correspondência com o Barão Spedalieri, comporta mais de mil cartas). |
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